EM SÃO MIGUEL O ANJO

quinta-feira, 26 de julho de 2018

MESTRE ALBINO DE MOREIRA

Memórias com “cenário” a tela do mestre Albino José Moreira. E como me envolvi e vivi essas memórias aquando da minha participação como artesão/escultor nos “Encontros com a Arte” em Moreira da Maia, trago-vos outros pormenores “memoriais” que justificam este recordar.
Antes disso, e melhor e mais fácil que estar a descrever quem foi Mestre Albino, deixo-vos esta descrição do Dr. José Augusto Maia Marques que consta do site da Junta de Freguesia de Moreira, que podem e devem visitar.


Nasceu a 1 de Agosto de 1895, no lugar de Pedras Rubras da freguesia de Moreira. Criança obediente, não tendo aprendido a não ser as primeiras letras, desde cedo começou a ajudar o pai na sua profissão de barbeiro. A sua «veia artística» revela-se desde logo com desenhos tímidos e sonhadores nos cartuchos de papel da tasca. Casa em 1920 com a prima Maria Moreira nascendo-lhe pouco depois a sua única filha Pureza. Para complementar os parcos rendimentos da tasca/barbearia, ia biscatando aqui e acolá de funileiro e de picheleiro, especializando-se na iluminação a gás. Com o advento da eletricidade, adaptou-se a ela e passou também a exercer de eletricista. Chegou mesmo a constituir uma pequena empresa para distribuir eletricidade em algumas freguesias de Vila do Conde.
O seu gosto pelas artes levou-o a aproximar-se do teatro, e a desempenhar mais uma das suas «profissões», a de cenógrafo, através da qual se tornou conhecido por toda a Terra da Maia. Muitos eram os grupos dramáticos que o disputavam para pintar os cenários de uma peça Só numa idade já avançada, nos inícios dos anos 70, abandonou a atividade profissional para se dedicar exclusivamente à pintura. Em 1972 estreou-se num concurso do então SNI, sendo não só premiado, como «adotado» pela comunidade dos designados pintores naïf. Depois, passa a figura habitual nas exposições da Galeria do Casino Estoril, guindando-se ao primeiro plano dos artistas «primitivos modernos». A enorme importância da sua pintura para a Maia é a evocação fiel dos usos, costumes, tradições, monumentos, pessoas e acontecimentos, que a sua memória fotográfica e as suas cores vivas e dinâmicas verteram para a tela. É, verdadeiramente, um «fotógrafo» da ruralidade maiata. Faleceu a 3 de Maio de 1994”. - José Augusto Maia Marques

Pois foi devido à minha participação nos Encontros com a Arte, organizados no Salão Nobre dos Bombeiros de Moreira, pela Junta de Freguesia, que conheci o mestre, sempre tão acarinhado pelas entidades oficiais, artistas e público que frequentava estes encontros.
Uma dessas exposições foi designada de “Prémio Mestre Albino José Moreira”. Assim, artesãos, escultores, pintores e arte sacra, poderiam criar obra referente ao tema e concorrer ao Prémio Mestre Albino.Como artesão/escultor das horas livres e na altura a exercer a actividade profissional no Centro de Saúde de Águas Santas, reparei que os trabalhadores da autarquia local andavam a derrubar um cedro seco no recreio da escola dos Moutidos, frente ao Centro de Saúde.
Como o cedro é madeira macia e boa para esculpir, falei com o então presidente da Junta, Manuel Correia a quem solicitei dois pedaços do cedro, que prontamente lá me mandou escolher, pois, velho e seco era para queimar.
Escolhi e os trabalhadores cortaram conforme desejei.
Aprontei-me então a esculpir um dos troncos, todos os dias, depois do trabalho e aos fins-de-semana. Tinha que encontrar obra para representar o Mestre e participar no “Prémio Mestre Albino.
Sem mais pormenores, deixo-vos do mestre, a pintura do seu retrato e das canastras florais da Maia.
Dos Encontros com a Arte em Moreira, o prémio e a foto da escultura referente à distinção, que ficou na autarquia de Moreira, e foi criada a partir do pedaço de cedro de Águas Santas. Do outro pedaço, esculpi a coruja que ainda ornamenta os meus aposentos a recordar, entre outras obras, a minha entrega à arte, a partir destes encontros, pela mão amiga do então presidente da Junta, senhor David Branco. 


sexta-feira, 20 de julho de 2018

OS FONTANÁRIOS DO POVO


OS FONTANÁRIOS DO POVO
Com o fim do regime de ditadura em Abril de 1974, que desabrochou em democracia e liberdade na procura de progresso e justiça social dos portugueses; despoletou-se um despertar na intervenção individual e coletiva na procura de soluções imediatas para as necessidades mais prementes das populações.
Entre essas necessidades estavam o abastecimento de água e o saneamento. 
Por isso, por todo o país foram surgindo movimentos populares, muitos organizados em comissões e associações de moradores. O voluntariado andava em movimento constante na resolução de problemas das populações, muitos com a ajuda das Câmaras Municipais, e muitos mais, com a única ajuda coletiva dos moradores, com a sua unidade, força e empenho na solução de problemas que eram seus e sentidos por todos.
Os fontanários, para além dos já existentes criados pelas Câmaras municipais, muitos outros foram construídos por esses movimentos populares locais, para aproximarem ainda mais o abastecimento de água das suas habitações.
Numa curta caminhada pela freguesia de Pedrouços, cortando por Sangemil, dos seis que fontanários que fotografei, 3 são obra do povo, símbolos dessas movimentações entusiastas e revolucionárias, de grande motivação e participação das populações na resolução dos seus problemas.

Os ventos de mudança levavam na sua dianteira a célebre frase e citação de Fernando Pessoa: “Deus quer, o homem sonha, a obra nasce”.
E assim foi. E assim foram surgindo obras e mais obras, e entre muitas delas, as que mais humildemente ainda hoje bem simbolizam esses movimentos, são os fontanários. Neles se encontram alusões ao pensamento de Fernando Pessoa: - “Quando o homem quer, a obra nasce” ou “Quando os moradores querem, as obras fazem-se”.

Se na sua maioria os fontanários já não tem a serventia que tinham, nem se veem junto deles aquelas filas de baldes, regadores ou canecos para se abastecerem de água, é muito bom sinal. Valeu a pena!
José Faria

sexta-feira, 13 de julho de 2018

LENDA OU MILAGRE DE PEDROUÇOS

No monte pedregoso que terá dado o nome de Petrauzos, pedrouzos ou pedroucos, e atualmente Pedrouços, à mais jovem freguesia da Maia, reza a história, de tempos muito distantes, que me foi “legada” por Avelino Moura Lopes, que foi membro da Comissão Instaladora desta nova freguesia.
Sobre o nosso diálogo e abordagem sobre a lenda ou milagre, que se verificou no cimo desse montado pedregoso, e muito antes da construção da Ermida a São Pedro, há muito desaparecida e no lugar onde hoje se encontra a capela da Nossa Senhora da Natividade, descrevo-a da seguinte forma:

Andava uma mulher do povo a estender roupa entre mato e giestas. Sobre uma cama de fetos improvisada, coberta com o seu avental, deitou à sombra o filho de tenra idade, enquanto estendia a roupa a corar e a secar ao sol.
A fome despertou a criança que desatou a chorar continuamente. 
Apressada e cuidadosa, a roupeira ergueu o cachopo nos braços e aconchegou-o ao peito, sentada num penedo. 
Deitada sobre o colo da mãe, de boquita aberta e sôfrega, o cachopo procurava desesperado o mamilo da progenitora, que prontamente lhe solta a mama a descoberto sobre o franzino e tenro rosto.
Entretanto, o cheiro do leite atraíra uma cobra que deslizou silenciosamente na sua direção, e saltara-lhe para o regaço.
Aflita e assustadíssima, a mulher mais não fez do que rezar com toda a sua fé ao Senhor dos Aflitos, pedindo-lhe que a livrasse do réptil. 
E, parecendo obedecer a ordem divina, a cobra sem lhe provar o leite nem os morder, deixou-se deslizar pelo regaço abaixo até ao chão e foi de novo recolher-se no interior de uma brecha entre dois penedos a seus pés.
Acreditando tratar-se de milagre, a roupeira ajoelhou-se rezando e agradecendo ao Senhor por a escutar, prometeu mandar construir uma capela junto ao caminho na encosta do monte.


E é esta a Capela, construída por volta de 1440. No seu interior permanece uma cruz em pedra com a pintura do Senhor dos Aflitos, com a serpente à volta do corpo.
Quase despercebida, esta capela é de propriedade privada, de lavradores de Pedrouços. À sua esquerda, muito antes das construções das habitações laterais, (que a entalaram) havia uma estreita escadaria “manhosa” que foi criada quase 300 anos depois, aquando da construção da Igreja de Pedrouços, em 1743, que foi ampliada por volta de 1871, tendo e 8 de Setembro de 1928, passado a ter como Orago, Nossa Senhora da Natividade, pelo 1º Ciclo do Porto, Areosa, Pedrouços.
Com base nessa estória e embora mantendo algumas dúvidas sobre as manifestações religiosas que se desenvolveram a partir da sua construção, a verdade é que muitos cruzeiros foram erigidos a partir daí, possivelmente 14 que representariam a Via Sacra que se estendia pela rua Luís de Camões,frente à capela, seguindo por António Simões, Levadinha e rua do Calvário, (hoje Plácido D’Abreu) até ao Calvário de 3 cruzes que se situava, próximo de onde é hoje a entrada sul da Casa do Alto, onde terminava essa rus junto ao pinhal, antes de chegar à Mansão da Colina = casa do Alto.
E ficou-me essa ideia como mais lógica, pois não há registo que o digam ou contradigam.
Para além desta narrativa, elaborei a poesia condizente de forma a informar e perpetuar culturalmente a lenda ou milagre de Pedrouços que consta do meu primeiro livro de “Contos e Versos do Meu Caminho” editado pela Papiro Editora.


O MILAGRE
(Lenda de Pedrouços – Maia)


Andava a mulher na lida,
Sobre as pedras a estender;
Roupa lavada, espremida,
Para secar e aquecer.


Andava a mulher na lida,
No cimo do monte a corar,
Rouparia sacudida,
E o cachopo a chorar.


Deitado em fetos e rama,
De fome chorava a criança;
Ansiando o leite, a mama,
Amor de mãe logo a alcança.

 Pega o cachopo no colo,
Teve a lida que esperar;
Deu a mama, deu consolo,
À criança a amamentar.


Pela brecha de um penedo,
Uma cobra ou serpente;
Tolheu a mulher de medo,
Ao surgir tão de repente.


Assustada a roupeira,
Pôs-se aflita a rezar…
Mas a serpente matreira
Foi o seu leite cheirar.


Com a cobra sobre o peito,
A orar naquela hora;
Que um milagre fosse feito,
Para que e o bicho fosse embora.


Pela graça concedida,
Uma capela ali nasceu;
Naquele local erguida,
Como ao senhor prometeu.

José Faria🤔✍️😲📚📖
(Publicado em Memórias da Maia, em "Contos e Versos do Meu Caminho e em "LENDAS DA MAIA"