Tempos houve
muito lá atrás da revolução de Abril de 1974, em que era muito difícil aos
portugueses emigrarem, sem passaporte e sem razões que o estado o justificasse.
Assim, no tempo
do regime político de ditadura fascista, para fugirem à fome, ao desemprego e
ao cumprimento obrigatório do serviço militar com guerra no ultramar, muitos
jovens emigravam, a salto. Muitos eram presos e considerados refratários.
Nalguns casos ainda ajustavam contas com a Polícia de Intervenção em Defesa do
Estado /DGS, e saiam bem magoados e marcados, quando saiam. (!?)
Davam o salto
para Espanha e daí para França, Canadá, Alemanha, Brasil e outros países.
Haviam
portugueses que se dedicavam a “passadores”, do género dos que hoje fazem o
mesmo com os refugiados abandonados à sua sorte em embarcações.
Muitos foram os
grupos, que a troco de uma determinada quantia de pagamento aos “passadores”,
atravessaram montes e vales até Valença, onde, atentos e a coberto da noite,
esperavam o render da guarda da fronteira, para darem o salto para o outro lado
de Espanha.
Normalmente
aguentavam horas encurralados a aguardar o momento mais preciso, de distração
da guarda, para avançarem sem serem vistos. Por vezes atravessando o rio Minho
nos sítios de menor profundidade.
Por lá andou
também o Manel “pisco” na construção civil em terras de França, que viria a
adoecer gravemente e que, sem meios, ainda conseguiu dar o “salto” de regresso
para vir morrer a casa.
Menos sorte
teve o Zé “greta”, que no barraco da obra em construção, adormeceu uma noite
para nunca mais acordar, devido ao fogareiro que lhe aquecia a noite fria e lhe
roubou a vida. Por lá ficou.
Numa dessas
passagens a “salto”, o passador Luís levou mais um grupo, entre eles o seu
irmão e o sobrinho. Já passavam das quatro da madrugada quando chegaram ao ponto
de vigia para controlar a movimentação na fronteira. O luar estava claro,
obrigando o grupo cansado e com sono, a ficar quase duas horas agachado no
monte entre arbustos, de olhos postos no movimento dos carabineiros na
fronteira e ponte sobre o rio Minho.
Por volta das
seis da manhã, no render da guarda o Luís, diz ao grupo para avançar e o
seguir, sem barulho.
Como coelhos
temerosos, evitando a luz da lua, lá foram sorrateiros e conseguiram chegar ao
lado de lá.
“ Pronto,
estamos em Espanha! Estão todos!? – e deitou os olhos ao grupo.
- O meu
sobrinho, o José!?
Todos se
entreolharam. Ninguém se apercebera se ele os tinha acompanhado ou não.
- Não me digas
que ele adormeceu no monte!? – Exclamou o Luís.
Não podemos
fazer nada, não podemos ir para trás, é muito arriscado.
Ainda esperaram
algum tempo a ver se ele aparecia, mas tiveram que seguir caminho.
Na verdade, o
José, moço dos seus 20 anos, cansado e ensonado adormeceu e ficou só no monte.
Só dois dias
depois, quando o seu tio regressou a casa a Santo Tirso, se encontrou com o
José, que lhe confirmou que tinha adormecido e que acordara só a meio da manhã.
Valeu-lhe a
sorte de descendo à estrada, conseguir uma boleia de um camionista que o deixou
a poucos quilómetros de casa.
Contos de José
Faria
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