Visitando
as melancólicas ruinas de Pompeia, aponta-se, fora das muralhas, o lugar onde
as escavações trouxeram à luz, depois de dezassete séculos, o cadáver de um
sentinela romano.
Apareceu
junto da guarita, ao lado da porta que dava de rosto ao Vesúvio; apareceu
incinerado mas de pé e com a lança segura na mão direita.
Dali
ouvira os pavores estrondosos com que a cratera pronunciaba a fúnebre
catástrofe; ali sentira debaixo de si abalarem-se com a comoção vulcânica as
raízes das montanhas; dali vira surgirem, dilatarem-se, avançarem as
tempestades de fogo, rolarem-se precípites. As correntes caudais de lava
aproximarem-se até o envolverem, as chuvas de cinza, de enxofre, e de escórias.
Mas não arredou pé. Não fugiu, curvou a fronte e ficou, para assombro da
posterioridade, com a face voltada ao sítio de onde lentamente viera a colhê-lo
de morte.
A
medonha destruição da cidade não foi instantânea, como fulminada de raio.
Salvaram-se na fuga os moradores, homens, mulheres, crianças, enfermos. Muitos
chegaram a recolher e a levar os seus melhores haveres e jóias, que tão poucas
foram descobertas pelas pesquisas. Alguns ainda levaram e conduziram animais
domésticos. Nem os escravos nem os mesmos desprezíveis escravos, que deram a
velar as propriedades desamparadas de seus senhores.
Tudo,
por terra e por mar, se escapou e se pôs a bom recato, como evidenciam as
exumações naqueles sombrios destroços.
E
que é dela a causas por que não fugiu e s deteve aí, diante do horroroso
espetáculo e vítima dele, o mísero soldado, aquela solitária sentinela!?
Porquê?
Pelo santo princípio do dever, pela lei suprema da honra. Ficou!
Aires
de Gouveia – Ensaios do púlpito – Século XIX
Do
Livro de Leitura de (Parte II 2º Ano) – 24- VI – 1950
Por
José Faria
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