EM SÃO MIGUEL O ANJO

quinta-feira, 30 de junho de 2022

FOOOOOOGO! JÁ AAARDEEEE!

 


FOOOOOOGO! JÁ AAAAARRRRRRDE!

Há muito que se perdeu do ouvido e do tempo, aquele tilintar persistente e compassado dos pedreiros. Aqueles berros de alerta para o perigo dos tiros nas pedreiras.
“fooogoo, já arde! Fooogo, foooogo, já arde! 
Minutos depois, o estrondo, o rebentamento da penedia, seguido por vezes, de uma chuva de pequenas pedras a cair do céu por entre giestas, pinheiros e eucaliptos.
Era a vida dos montantes pedreiros que extraíam a pulso e a dinamite a pedra dos montes.
Até aos anos sessenta, as terras da Maia eram “férteis” em pedreiras. Muitos eram os montados, as bouças rasgadas a pulso pelas mãos dos montantes pedreiros.
Pude acompanhar o meu progenitor em algumas delas, em Águas Santas, no Boi Morto, em Milheirós e no Monte Penedo.

Uma vida rude que exigia resistência, força e até brutalidade, dos homens que a pulso, ferro e fogo, desbravavam montes de granito sem a existência de máquinas, que ainda as não havia.
Também na “razão destes versos” não poderia deixar de contemplar a bravura e o engenho daqueles que faziam da pedra o que queriam com meios tão artesanais. Conheciam todas as características e os veios e pontos fracos da pedra no seu estado natural como as suas calejadas e gretadas mãos, de pulsos papudos por forças provocadas por excessos de força, de luta de trabalho e de resistência humana.

 
MONTANTE
 
A derrubar montanhas,
Montante de profissão,
De xisto ou de granito,
Rasgadas por sua mão.
 
Já o dia se levanta,
Se levanta a força, o grito:
Canta o pisco, chasco canta,
Canta o picão no granito.
 
Montante que lá no monte,
Tua força não conheces;
Sai de tuas mãos a pedra,
P’ra palácios. Desconheces?
 
É feito um furo no bolo,
Com a broca à pulsação,
Num compasso cantador,
Que dá força ao marretão.
 
É metida a dinamite,
Nas entranhas da montanha;
Mãos robustas, cuidadosas,
Não se percam na façanha.
 
Já o tiro rebentou!
Cuidado, não saltem guilhos.
Não vá a pedra que voou,
Deixar sem pai os teus filhos.
 José Faria
 

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